domingo, 29 de março de 2009

Diante da Vida – II


A vida é o solo abençoado onde germinam as sementes de nossas ações. Sê tu, pois, como o prudente semeador que seleciona cuidadosamente o grão, a fim de que não sejam comprometidas a qualidade e a quantidade da colheita.
É compreensível que tu, ante o legado da vida, busques as flores e recuses os espinhos. Reflete, porém, que a ciência da felicidade não consiste apenas em colher flores, mas sobretudo em transformar em flores os espinhos que nos ferem.
Utiliza-te prudentemente do tempo, se não queres que o tempo te inutilize. Evita que tuas horas transcorram em vão, enchendo-as com uma atividade que te comunique, a cada instante, a alegria de te sentires permanentemente superado por ti mesmo. Nisso consiste o segredo dos que logram transcender os estreitos limites do tempo, para se sentirem partícipes do Eterno.
Sê forte, para venceres na luta pela vida. Mas, nunca te esqueças de que, para venceres verdadeiramente, muitas vezes terás de deixar que te vençam. Não há maior heroísmo do que saber suportar o peso da derrota.
Não alimentes o propósito de superar o teu semelhante em coisa alguma. É essa uma inferioridade que te ensina que é a ti mesmo e não a outrem que te importa superar. Persuade-te de que só há um triunfo digno de teu esforço: é o triunfo sobre ti mesmo.
Trata a todos com igual solicitude e não desdenhes de teu próximo, porque ele te pareça de condição inferior. Lembra-te de que tu e ele estais irmanados pela identidade de origem e destino. Se, entre ti e ele, existe a diferença de um rio para um regato, não olvides que ambos brotastes do seio da mesma terra e ireis fundir-nos na imensidade do mesmo oceano.
Abstém-te de fazer alarde de tuas boas qualidades. Sê modesto, como convém aos espíritos verdadeiramente perfeitos. O homem de bem assemelha-se à flor que, humildemente escondida na relva, oloriza com suavidade o ambiente em que viceja.
Jamais te prendas ao agressor por um ato de vingança, senão por um impulso de perdão. Vingando, tu te escravizas à dor; perdoando, tu te libertas dela. A vingança é filha do ódio e o perdão é filho do amor, e o ódio está para o amor, como o inferno está para o céu.
Guarda-te de te julgares um sábio. Nada melhor evidencia tua estulta presunção do que ignorares tua própria ignorância. Se nem sequer desvendaste o mistério de ti mesmo, como, pois, pretendes haver desvendado o mistério do universo que te circunda?
Inicia-te, pois, no conhecimento de ti mesmo, se queres conhecer a misteriosa essência das coisas. Não é fora de ti, mas em teu próprio intimo, que o Absoluto se te faz imediato e se te revela acessível.
Cultiva com carinho o teu espírito. Mas, não cuides simplesmente de ser culto, senão também de ser bom. A cultura poderá dar-te a gloria dos homens, mas só a bondade poderá conferir-te a glória de Deus.
Por que estranha incompreensão tu te queixas da dor que, ferindo-te, constrói teu glorioso porvir? Que te parece se o mármore informe e rude se queixasse do escultor que nele plasmasse uma forma divina?
Procura identificar a presença do bem no fundo de todas as coisas. Não há maior miséria de que ter olhos para somente ver a miséria.

(Do livro O Primado do Espírito, de autoria de Rubens Romanelli)

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